quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

René Jules Dubos

"Pense globalmente, aja localmente".

Retorno novamente, como prometido, ao livro Ecologia – uma estratégia para a sobrevivência, com o intuito de destacar, além da importância e atualidade desta obra, outro grande filósofo e pensador citado no livro que, embora não sendo ecologista profissional, influenciou profundamente o pensamento ecológico. Estou falando do professor René Jules Dubos, Professor Emérito de Biomedicina Ambiental na Rockefeller University em Nova York.

Dubos (1901-1982), nascido na França, emigrou para os Estados Unidos quando jovem e fez nome como bacteriologista em pesquisas médicas, na década de 30. Foi, sem dúvidas, um dos mais influentes biólogos do século XX e um dos responsáveis pela conscientização do homem a respeito das questões ambientais. Microbiologista, educador, escritor (um de seus livros ganhou o Prêmio Pulitzer – So human na animal - 1968) e ambientalista.


Foi, também, um filósofo que sempre manifestou "fé criadora" e esperança nos destinos da Terra e da humanidade. Microbiologista de profissão, foi pioneiro na descoberta dos antibióticos. Juntamente com a bióloga Rachel Carson, René Dubos foi um dos pioneiros da conscientização de que os homens e os animais estão em interação constante com o meio em que vivem.

Fortemente influenciado por Lewis Mumford, por quem sempre teve grande admiração (considera-o um vidente), iniciou sua carreira concentrando-se na saúde do homem e considerando o ambiente em termos de bem estar humano. Considerava um absurdo pensar em meio ambiente sem levar em conta que o homem é a parte mais importante do problema. Seu campo de estudos sempre foi o homem e tudo que o cerca e o efeito de cada um sobre os outros.
Seu tema dominante é que, para melhorarmos nosso bem estar físico e intelectual, precisamos, em primeiro lugar, compreender bem e depois controlar o nosso impacto sobre aquilo que nos cerca. Para Dubos é mais do que evidente que o controle de nosso meio ambiente só pode ser conseguido quando houvermos primeiro compreendido a natureza e a história do homem.

Em sua profissão, é mais conhecido por duas descobertas feitas em virtude de seus primeiros trabalhos como pesquisador médico, uma delas prática e a outra teórica. Ele descobriu uma enzima que ataca o micróbio causador da pneumonia e revolucionou aquilo que é conhecido como a Teoria do Germe. Nesta teoria mostrou que os organismos causadores das doenças não são inerentemente destruidores.

Seu trabalho despertou o interesse pela penicilina - que permanecera esquecida após sua descoberta por Alexandre Fleming, em 1928 - e levou ao desenvolvimento de outros antibióticos, como a estreptomicina e as tetraciclinas. Foi, também, pioneiro no estabelecimento de métodos que levaram à padronização em escala internacional da vacina contra a tuberculose, a partir do bacilo Calmette-Guérin (BCG).

Dubos acreditava que um organismo vivo - seja ele um micróbio, uma pessoa, uma sociedade ou um planeta - só pode ser entendido no contexto das relações que forma com as coisas ao redor.

De suas investigações surgiu o conceito de que a doença não é apenas o resultado da presença de um patógeno no organismo, mas antes um ecossistema que abrange múltiplos eventos. Com essa forma de pensar, Dubos reformulou a teoria do surgimento da doença com a inclusão do meio ambiente nas considerações de suas causas.

O elemento importante na doença, afirmava ele, não é a infecção mas principalmente qualquer stress - seja exterior ou interior - que altere a resistência do organismo, provocando o desenvolvimento e determinando o desfecho da enfermidade.

No seu livro Mirage of Health, de 1959, ele dizia que a saúde não é necessariamente um estado de vigor e bem-estar, nem mesmo de vida longa. Saúde é "você poder funcionar, fazer o que quer fazer e vir a ser aquilo que deseja ser." Com essa definição, a responsabilidade de permanecer saudável foi colocada sobre o paciente e não sobre o médico ou sobre a medicina.

Da mesma forma que observara as interações entre os microrganismos e o ecossistema do solo, depois entre os micróbios e o homem, Dubos ampliou seu interesse para uma escala planetária e passou a observar e a descrever as adaptações que acontecem entre a humanidade e a Terra, através das quais uma vai moldando a outra.

De suas experiências com bactérias do solo, ele deduziu um princípio fundamental: todo organismo vivo possui múltiplas potencialidades e as que ele consegue expressar dependem das influências externas. Essa adaptabilidade, segundo ele, funciona também com as pessoas.

Nas suas palavras:

"Todos nós nascemos com potencialidade para nos tornarmos diferentes pessoas, mas o que nos tornamos realmente depende das condições sob as quais nos desenvolvemos. Essas condições, além do mais, são freqüentemente resultado de nossa própria escolha."

Sua visão particular de que os organismos influenciam o meio e por sua vez são por ele influenciados, o fez descrever-se como um "desesperado otimista", ao contemplar as depredações do homem sobre o ecossistema global. Ainda que as ações humanas possam ser às vezes bastantes destrutivas ao planeta terra, ele acreditava que elas podiam também restaurar e até criar novos ambientes capazes de melhorar a condição humana.

Embora algumas das primeiras advertências sobre desastres ecológicos tenham sido feitas por Dubos, ele passou a criticar os que pregavam o fim do mundo. Cientista lúcido, com uma mensagem sábia e confiante, não se engajou no movimento ambientalista dos anos setenta, que considerava a natureza como vítima e a humanidade como agressor.

Nas suas palavras:

“Fico terrivelmente perturbado ao ver como em uma cidade da importância de Nova York uma criança, qualquer que seja o seu meio social, encontra-se exposta, desde os seus primeiros momentos, aos barulhos externos, à sujeira, à desordem e à feiúra. Tenho a certeza de que isso condiciona o indivíduo de uma forma horrorosa. Não acredito que nada disso mate as pessoas, e é aí que estou em divergência com os mais alarmantes ecologistas, como Paul Ehrlich, e que me bato com Barry Commoner, embora sejamos muito amigos. Sempre lhes digo que, na minha opinião, o perigo não está em sermos todos liquidados pela poluição ou pela explosão demográfica. O que vai acontecer é que aceitaremos a situação e acabaremos conformados com ela. É bem possível que, afinal de contas, venhamos também a sofrer fisicamente, mas o perigo imediato está no fato de estarmos perdendo a noção do que o ambiente poderia e deveria ser.”

Dubos considera que a capacidade do homem para a adaptação é um dos atributos que mais claramente distingue o mundo vivo do mundo da matéria inanimada. Esse atributo é uma dádiva, mas também pode ser uma ameaça potencial, pois o estado de adaptatividade do mundo de hoje pode ser incompatível com o mundo de amanhã.

Ele reconhecia que a qualidade de vida podia estar se deteriorando, mas mantinha uma grande fé na criatividade do homem e no seu potencial para a renovação e a autotransformação. Por causa de sua visão ampla, foi escolhido, juntamente com a economista inglesa Barbara Ward, para redigir o relatório da Primeira Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, no ano de 1972.

No seu livro, Reason Awake, Dubos segere algumas maneiras de orientar o pensamento, como por exemplo:

- “As restrições ecológicas ao crescimento da população mundial e à produção de energia e de bens de consumo acabarão gerando novas espécies de problemas científicos.”

- “A drástica limitação do tamanho da família irá, provavelmente, criar perturbações sociais, psicológicas, fisiológicas, e, talvez, até mesmo genéticas, a respeito das quais pouco ou nada se sabe.”

- “A distribuição e a utilização da energia sob condições controladas tornarão necessário um conhecimento sofisticado de ecologias regionais e espaciais.”

- “Tecnologias inteiramente novas e, portanto, novas espécies de conhecimentos científicos, terão de ser desenvolvidas para reduzir ao mínimo a poluição e estabelecer um novo ciclo para os recursos naturais deficientes.”

- “O estado autoritário obrigará, assim, a uma reorientação do empresariado científico e tecnológico. Na verdade, poderá até mesmo levar a uma renascença científica. Isso, porém, jamais acontecerá se não houver esforço consciente e provavelmente penoso, por parte da comunidade científica.”

Dubos via o homem contemporâneo dividido entre uma aceitação passiva da tecnologia científica e uma repentina rejeição pânica. Não acredita que a resposta seja qualquer das duas alternativas. No entanto, os debates entre os cientistas especializados no assunto são para ele um sinal esperançoso, já que somente por meio de um debate aberto pode o público se colocar a par dos problemas vitais e partilhar a tentativa para controlar a ciência e a tecnologia para bem usá-la em lugar de malbaratá-la, como no passado.

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