terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A Arte de Calar

Abade Dinouart

Foi no livro Palomar do Italo Calvino que eu encontrei esta pérola de sabedoria sobre a importância do silêncio. É do texto intitulado “Palomar em Sociedade – Do morder a língua”, do livro acima citado, que transcrevo este parágrafo revelador sobre a arte de calar, mais difícil ainda do que a arte de dizer:

“Na verdade, mesmo o silêncio pode ser considerado um discurso, enquanto refutação ao uso que os outros fazem da palavra; mas o sentido deste silêncio-discurso está nas suas interrupções, ou seja, naquilo que de tanto em tanto se diz e que dá um sentido àquilo que se cala.”

Trago este assunto como introdução ao livro que sugiro para leitura de beira de praia. Trata-se de um pequeno livro intitulado A Arte de Calar de autoria do Abade Dinouart, com apresentação de Jean-Jacques Courtine e Claudine Haroche, lançado pela Editora Martins Fontes em 2002.



A Arte de Calar
Abade Dinouart
Editora Martins Fontes
São Paulo, 2002
Isbn 85-336-1366-0
80 páginas

O tratado de Dinouart (Joseph Antoine Toussaint Dinouart), escrito em 1771, convida o leitor a fazer um conjunto de reflexões e indagações sobre a função do silêncio nos vários setores da vida. Muito mais do que preconizar o silêncio absoluto, ou uma mística de um mundo enclausurado no silêncio, A Arte de Calar é, na verdade, uma arte de falar, um outro capítulo da retórica. Não se trata de uma arte de fazer silêncio, e sim, muito mais, de uma arte de fazer alguma coisa ao outro pelo silêncio. Nas palavras de Dinouart “...o sábio mantém um silêncio expressivo, que se torna uma lição para os imprudentes e um castigo para os culpados”.

Neste sentido, o rosto fala pela língua e, para calar, não basta fechar a boca. Porque não haveria nisto nenhuma diferença entre o homem e os animais. O silêncio do homem deve significar, pois A Arte de Calar é, certamente, uma paradoxal arte de falar. É uma eloqüência muda. Sua obra insere-se na tradição de uma retórica do corpo: A Arte de Calar é uma arte e uma disciplina do corpo, uma contribuição a uma parte fundamental da retórica: a ação oratória.

É claro que o silêncio, por si só, no rosto de alguns representa o vazio, tanto quanto a fala exagerada e vaidosa é a linguagem dos idiotas. Trata-se, portanto, da busca do equilíbrio estratégico entre o calar, falar e, principalmente, ter o que dizer. Não se trata, portanto, de um falar para si, mas um fazer-se entender. Não se trata da submissão verbal mas fundamentalmente, do conhecimento tácito das relações diretas entre conteúdo, quem fala e quem ouve. Neste sentido, temos que ter muito cuidado, pois o silêncio de quem ouve pode não ser atenção e absorção de conteúdo, pode ser pena e comiseração.

Isto posto, o interessante no tratado de Dinouart, é lembrar que o silêncio é um componente fundamental da eloqüência. É lembrar, também, que não se pode compreender o conteúdo de um discurso somente a partir da densidade verbal que ele é capaz de desenvolver. Trata-se, portanto, de exercitar a sabedoria da síntese e do equilíbrio, descartando o falso saber da densidade verbal, valorizando a frase correta e o discurso da pausa e do silêncio. Sem dúvidas, não é uma tarefa fácil. Principalmente, para os falsos oradores que abusam das palavras ou para aqueles que diante da oportunidade da fala, falam para si mesmos, sem o eco do entendimento de quem os ouve. O falar para si é o exercício do pensar, portanto, não necessita de um interlocutor. Ter um interlocutor e, portanto, falar para os outros, parte do princípio do ter o que dizer. Em síntese, trata-se da existência de uma ética do silêncio na palavra e na escrita, para aqueles que se perdem pela língua e pela pena.

Para Dinouart:

“Só se deve deixar de calar quando se tem algo a dizer que valha mais do que o silêncio, pois o primeiro grau da sabedoria é saber calar; o segundo, saber falar pouco e moderar-se no discurso; o terceiro é saber falar muito sem falar mal e sem falar demais.”

A superioridade do silêncio sobre a palavra, na conduta ordinária da vida, funda-se, assim, num ideal de autoconservação que extrai seus recursos da imobilidade e que vê na palavra um risco. O homem nunca é tão dono de si mesmo quanto no silêncio: fora dele, parece derramar-se, por assim dizer, para fora si e dissipar-se pelo discurso, de modo que ele pertence menos a si mesmo do que aos outros. Em A Arte de Calar lê-se a crença em uma perda de substância corporal, quando porventura a língua se solta. O perigo da palavra é levar o homem a não mais se pertencer, a perder a posse de si mesmo. Neste sentido, o silêncio torna-se uma virtude. Não há excesso a temer no silêncio – ao contrário da palavra – pois o nada é menos afetado pela categoria do demais. Mais vale passar por não ser um gênio de primeira grandeza, permanecendo frequentemente em silêncio, do que por louco, abandonando-se à comichão de falar demais.

E Dinouart segue inflamamando quando afirma que:

“O Silêncio é necessário em muitas ocasiões, mas é preciso sempre ser sincero; podem-se reter alguns pensamentos, mas não se deve camuflar nenhum. Há maneiras de calar sem fechar o coração; de ser discreto sem ser sombrio e taciturno; de ocultar algumas verdades sem as cobrir de mentiras.”

Claro que é preciso que se diga que o imperativo do silêncio de que o livro trata responde a um ideal psicológico dominado pelo autocontrole e por um modelo de conduta social governada pela prudência necessária para se viver bem e em segurança no século XVII, uma preocupação constante e permanente que habita os manuais de civilidade e os tratados de conveniência e polidez daquele período.

A Arte de Calar, publicada em 1771 é um ato político, um apelo à ordem, no sentido mais forte do termo e participa, assim, da resposta ao desenvolvimento das forças políticas e das correntes filosóficas que, na metade do século XVIII, contestam a autoridade da Igreja, ao mesmo tempo que a vida social e a investigação científica escapam do enfeudamento religioso. A ascensão do individualismo rompe a dominação dos valores tradicionais. Torna-se necessário defender a Igreja e reduzir ao silêncio aqueles que a atacam e, neste sentido, o texto resgata o poder perdido de fazer-calar, uma espécie de “reforma geral dos escritores”, mais ou menos como exterminar em um país os envenenadores.

A obra reflete assim, à sua maneira, a ruptura entre religião e moral que se produziu gradualmente ao longo dos séculos XVII e XVIII. É a substituição do sistema que fazia das crenças religiosas o quadro de referência das práticas comuns, por uma ética social que passa a formular uma ordem das práticas sociais.

Mas nada disto obscurece a importância da obra. Pelo contrário, torna-a atual, principalmente, diante de tantos textos e discursos vazios. Nos faz refletir sobre a eficiência das nossas interlocuções e nos remete ao mundo da síntese que faz uso do silêncio e transforma-o, quando corretamente aplicado, no melhor de todos os discursos.

Diferentes Espécies de Silêncio
Capítulo II

1 – O silêncio é prudente quando se sabe calar oportunamente, conforme o tempo e o lugar em que se está no mundo e conforme a consideração que se deve ter para com pessoas com quem se é obrigado a tratar e a viver.

2 – O silêncio é artificioso, quando só calamos para surpreender, seja desconcentrando os que nos declaram seus sentimentos, sem lhes dar a conhecer os nossos, seja tirando proveito do que ouvimos e observamos, só querendo responder por modos enganadores.

3 – O silêncio complacente é uma aplicação não somente em escutar, sem contradizer, aqueles a quem desejamos agradar, mas ainda em lhes mostrar o prazer que temos com sua conversa ou com sua conduta; de maneira que os olhares, os gestos, tudo supra a falta da palavra, para aplaudi-los.

4 – O silêncio zombador é uma reserva maligna e afetada, a não ser interrompida, sobre as coisas desprovidas de sentido ou inconsideradas, as bobagens que ouvimos falar ou que vemos fazer, para gozar do prazer secreto que têm aqueles que se deixam enganar ao imaginar que os aprovamos e os admiramos.

5 – Há um silêncio espirituoso quando se percebe no rosto de uma pessoa que não diz nada um certo ar aberto, agradável, animado e capaz de dar a entender, sem o recurso à palavra, os sentimentos que quer dar a conhecer.

6 – Há, ao contrário, um silêncio estúpido quando, com a língua imóvel e o espírito insensível, o homem parece inteiramente abismado numa profunda taciturnidade que nada significa.

7 – O silêncio de aprovação consiste no consentimento que damos ao que vemos e ao que ouvimos, seja contentando-nos em lhe dar uma atenção favorável, que indica a importância que lhe atribuímos, seja testemunhando, por alguns sinais exteriores, que o julgamos razoável e o aprovamos.

8 – É um silêncio de desprezo não nos dignarmos a responder àqueles que nos falam ou que esperam que nos declaremos a respeito do que nos falam e olhar com frieza e arrogância tudo o que vem deles.

9 – O silêncio de humos é o de um homem cujas paixões só se animam seguindo a disposição ou a agitação de ânimo que o domina e de que dependem a situação de seu espírito e o funcionamento de seus sentidos; que considera bem ou mal aquilo que ouve, segundo a física desempenhe bem ou mal as suas funções, que só abre a boca para fazer piadas ou para dizer coisas desagradáveis ou inoportunas.

10 – O silêncio político é aquele de um homem prudente, que se poupa, que se conduz com circunspecção, que nem sempre se abre, que não diz tudo o que pensa, que nem sempre explica sua conduta e seus desígnios; que, sem trair os direitos da verdade, nem sempre responde claramente, para não se deixar revelar.

Então, fica aí a sugestão de leitura de beira de praia!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Anuidade do CauRS

Caro Profissional, o valor da sua anuidade 2012 é R$ 369,39. Você poderá pagá-lo através de parcela única, sendo concedido um desconto de 10% (R$ 36,94), ficando o valor total de R$ 332,45 com o vencimento para 31 de janeiro de 2012.

Caso seja do seu interesse, o valor da sua anuidade 2012 poderá ser parcelada, sem desconto, em 03 (três) parcelas iguais de R$ 123,13, ficando os seus vencimentos para 31/01/2012, 29/02/2012 e 31/03/2012.

Observações:

- Profissionais com menos de dois anos de formado ou com 30 anos ou mais de formatura terão 50% (cinquenta por cento) de desconto.
- Profissionais com 35 anos ou mais de contribuição terão 90% de desconto.
- Profissionais com 40 anos ou mais de contribuição ficarão isentos do pagamento de sua anuidade.

Caso os seus dados cadastrais não sejam condizentes com o exposto na referida Lei, e o valor não esteja correto, favor comunicar imediatamente ao CAU através do telefone 0800 88 30113 ou pelo e-mail dev@caubr.org.br.

Dados extraídos do site do CAU: http://www.caubr.org.br/