domingo, 25 de março de 2018

Curto, médio e longo prazo 3

Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RS - CauRS

O exercício de escrever para os jornais é muito interessante por vários aspectos. Não somente pelo alcance de público que os jornais possuem, o que seria destacar o óbvio, mas pelo exercício fantástico da síntese textual que determina um número máximo de palavras, considerando o espaço disponível para publicação e, em consequência disto, nos exige várias revisões didáticas do texto original - muitas vezes maior que o texto publicado - buscando recortar aquilo que pode ser suprimido, sem perder a ideia central do texto. Não é fácil, principalmente para aqueles, que como eu, se agarram às palavras do texto original como se fossem imprescindíveis. E não são!

Claro que no corta e recorta das revisões, vamos tirando alguns parágrafos e nos damos conta de que, muitas vezes, temos vários textos dentro de um só. Ou várias ideias centrais dentro de um mesmo texto que, por vezes, desviam o leitor na mensagem principal do autor. Minha metodologia de trabalho é inicialmente escrever um texto sem me preocupar com o tamanho e com a ordem em que as ideias vão surgindo. Num segundo momento ordeno os parágrafos, pois nem sempre, para mim, eles surgem já precisamente sequenciados. Em seguida, inicio a síntese identificando aquelas partes do texto onde é possível identificar mais do que uma ideia central. A quarta etapa é ajustar o texto aos espaços disponíveis pelos jornais que aceitam a sugestão de texto para publicação. O texto a seguir, publicado no dia 23/03/2018 pelo site do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RS - CauRS (www.caurs.org.br), registra a terceira etapa do processo acima descrito.


http://www.caurs.gov.br/curto-medio-e-longo-prazo-o-arquiteto-e-urbanista-paulo-bregatto-defende-reinvencao-do-espirito-solidario-em-grupo/

Curto, médio e longo prazo

Estamos presenciando transformações no mundo atual. Reformas sociais, inovações científicas, descobertas histórias, evoluções tecnológicas, entre outras. No entanto, indicadores que medem a qualidade de vida têm apresentado dados preocupantes: as pessoas não estão felizes. Avançamos em muitos setores da vida, mas não estamos sendo eficazes em transformar estes avanços em valor agregado capaz de nos permitir uma vida tranquila. Fatores essenciais como acesso ao trabalho, saúde, educação e segurança estão distantes da população.

Muitos destes avanços - pelo menos em escalas relativas - tem nos tirado da linha de risco da fome, doenças e guerras, mas este texto não trata destes avanços em grande escala. Trata da escala do dia a dia e do cotidiano das pessoas, onde a concorrência, a velocidade das coisas e as decisões urgentes, tem nos mantido alertas num clima de aparente tensão e medo.

Enquanto divulgamos e festejamos a implantação e a crescente produção da indústria 4.0, o desemprego cresce de forma alarmante, deixando sem ter o que fazer grande parte da capacidade humana de produção. O custo social deste fenômeno precisa ser mensurado com a mesma eficiência com que o mercado de ações comemora seus grandes resultados. Estamos presenciando índices de desigualdade social capazes de nos levar a conflitos civis de grande escala, como temos presenciado em nosso país.

A velocidade de processar dados digitais e projetar cenários virtuais deveria nos alertar para a importância de não vivermos na velocidade dos computadores, como se tudo fosse urgente, invertendo valores e transgredindo o bom senso, mas planejar com conhecimento de causa e consequência as nossas ações de médio e longo prazo, buscando acesso básico àquilo que agrega qualidade de vida à população. Vivemos um momento de produção cultural acrítica, bombardeados por muita informação, falsa e verdadeira, no entanto nunca produzimos tão pouco conhecimento capaz de nos tirar da zona de urgência. É o paradoxo da tecnologia digital: quanto mais geramos e acumulamos dados, menos sabemos como transformar estas informações em conhecimento. E é o conhecimento o vetor capaz de nos fazer avançar na definição de padrões de qualidade de vida.

Não são as ferramentas digitais, enquanto processadores matemáticos, que agregarão qualidade ao conhecimento. Poderão acelerar o cruzamento de informações e modelar novos padrões de vida, mas sempre será preciso que alguém interprete, traduza e transforme estas informações em conhecimento alinhado com as verdadeiras demandas da sociedade que estamos inseridos. A caneta sobre o papel nas empresas, o giz sobre o quadro verde na sala de aula ou o lápis de carpinteiro riscando uma parede no canteiro de obras, são suficientes para se expressar uma ideia inovadora e empreendedora, quando se tem uma verdadeira ideia.

Inovação, empreendedorismo e sustentabilidade se tornaram ferramentas de propaganda da sociedade atual. Mas elas não nascem em qualquer lugar, é preciso que o caminho esteja pavimentado com foco, investimento e cultura experimental. Para acertar em cheio é preciso experimentar muito. A experimentação está no cerne dos processos criativos inovadores e empreendedores. Experimentar exige autonomia e coragem e, por isso, é a base dos grandes acertos e das ideias inovadoras, e isto tem muito valor no mercado atual ou no mundo criativo compartilhado.

Temos a tendência superficial para acharmos que a genialidade de uma grande ideia é fruto do instantâneo mágico e veloz de uma única mente privilegiada. Quando fazemos isso, seja por conforto ou para explicar uma possível falta de atitude, damos as costas para o processo coletivo, compartilhado, contínuo e repetitivo das tantas experimentações e erros que vieram antes do acerto e que deram ao acerto o ambiente propício para sua invenção. Ser inovador, criativo e empreendedor não são o resultado de ações urgentes, isoladas, instantâneas, mágicas ou divinas. São o resultado de foco, planejamento e muito trabalho sério na busca de um objetivo e de uma solução.

As demandas urgentes que possuímos como povo, sociedade e nação não devem ser tratadas com abordagens superficiais de curto prazo, por mais midiáticos que possam parecer os seus efeitos, mas com ações maduras de planejamento criativo, inovador e empreendedor antevendo a qualidade de vida que queremos ter e o planeta em que queremos viver. Distanciar o olhar para esta realidade significa nos condenar a viver continuamente, década após década, usando as nossas melhores energias intelectuais e produtivas apenas para consertar a nossa própria falta de ação e visão atuais e a falta de planejamento estratégico das gerações que nos antecederam.

Planejar aprendendo com nossos erros e acertos já seria um bom caminho para os nossos gestores. Não se faz o novo negando os grandes acertos ou atropelando as experiências comprovadamente eficazes. Temos visto muito desta prática na gestão do país, empresas e universidades. O jovem não é garantia de inovação, a velocidade não é sinônimo de eficiência, o novo não é indicador de qualidade e a tecnologia não é condição única para os avanços do conhecimento. Claro que é preciso resolver muita coisa com brevidade, mas resolver com urgência o hoje, apenas cobre superficialmente os buracos do ontem, enquanto que a sociedade necessita de uma revisão dos seus códigos de convivência, de uma reformulação ética e moral capaz de pavimentar com inovação a sociedade do amanhã.

Temos que reinventar o nosso espírito solidário de grupo. Vivemos em um planeta digital conectados em rede, mas nunca nos comunicamos tão pouco e estivemos tão sós e isolados. Uma das qualidades que fizeram da espécie humana uma das mais bem sucedidas entre as demais foi a capacidade de agir e reagir colaborativamente com seus pares. Portanto, menos risco e tensão. Menos urgência e decisões superficiais. Mais seriedade e planejamento estratégico de médio e longo prazo para a vida.

Curto, médio e longo prazo 2

Jornal do Comércio (23/03/2018)

Coisa boa receber as manifestações positivas dos leitores sobre o texto que escrevi na semana passada falando das urgências de nossas vidas (urgências falsas e verdadeiras) e da consequente falta de ação e planejamento estratégico de médio e longo prazos, tão importantes na definição das nossas metas pessoais e profissionais. Planejar, de certa forma, significa antever alguns propósitos a serem atingidos e canalizar nossa melhor energia - individual e coletiva - para termos eficiência e eficácia para poder alcançá-los. O retorno que estou tendo sobre o impacto do texto revela que muitas pessoas tem parado para refletir sobre o assunto e sobre a urgência das coisas. Nem tudo são urgências, por mais que as pressões externas às vezes digam que sim.



"Planejar aprendendo com nossos erros e acertos já seria um bom caminho para os nossos gestores. Não se faz o novo negando os grandes acertos ou atropelando as experiências comprovadamente eficazes. Temos visto muito desta prática na gestão do país, empresas e universidades. O jovem não é garantia de inovação, o novo não é indicador de qualidade e a tecnologia não é condição única para os avanços do conhecimento. Claro que é preciso resolver muita coisa com brevidade, mas resolver com urgência o hoje, apenas cobre superficialmente os buracos do ontem, enquanto que a sociedade necessita de uma revisão dos seus códigos de convivência, capaz de pavimentar com solidez a sociedade do amanhã."

O resultado negativo destas tensões e frustrações é a contínua sensação de intranquilidade que tem povoado os corações das pessoas. Desta vez foi o Jornal do Comércio, em sua edição de sexta-feira e final de semana, que publicou o texto na página 4 - Opinião. Desde já, obrigado pelos e-mails e manifestações de carinho!

quarta-feira, 21 de março de 2018

Curto, Médio e Longo Prazo

GaúchaZH - Opinião

Recentemente escrevi um artigo sobre a necessidade de termos capacidade de planejamento para organizarmos nossas vidas buscando equilíbrio entre trabalho e lazer. De certa forma, sem nos darmos conta, vamos lentamente consentindo trabalhar mais e viver menos, movidos por um sentimento de urgência que aceitamos como se fossemos máquinas ou engrenagens deste sistema perverso que consome o nosso tempo apenas para o trabalho. Na sequência, o texto como foi publicado no GaúchaZH Opinião.


https://gauchazh.clicrbs.com.br/opiniao/noticia/2018/03/paulo-ricardo-bregatto-curto-medio-e-longo-prazo-cjeysgeza04gm01r4koun5r0j.html

Curto, Médio e Longo Prazo

Estamos presenciando transformações no mundo atual. Reformas sociais, inovações científicas, evoluções tecnológicas, entre outras. No entanto, indicadores que medem a qualidade de vida têm apresentado dados preocupantes: as pessoas não estão felizes. Avançamos em muitos setores da vida, mas não estamos sendo eficazes em transformar estes avanços em valor agregado capaz de nos permitir uma vida tranquila. Fatores essenciais como acesso ao trabalho, saúde, educação e segurança estão distantes da população.

A velocidade de processar dados digitais e projetar cenários virtuais deveria nos alertar para a importância de não vivermos na velocidade dos computadores, como se tudo fosse urgente, mas planejar com conhecimento de causa e consequência, nossas ações de médio e longo prazo almejando acesso básico àquilo que agrega qualidade de vida à população. Vivemos um momento de produção cultural acrítica, bombardeados por muita informação, no entanto nunca produzimos tão pouco conhecimento capaz de nos tirar da zona de urgência. É o paradoxo da tecnologia digital: quanto mais geramos e acumulamos dados, menos sabemos como transformar estas informações em conhecimento. E é o conhecimento o vetor capaz de nos fazer avançar na definição de padrões de qualidade de vida.

Planejar aprendendo com nossos erros e acertos já seria um bom caminho para os nossos gestores. Não se faz o novo negando os grandes acertos ou atropelando as experiências comprovadamente eficazes. Temos visto muito desta prática na gestão do país, empresas e universidades. O jovem não é garantia de inovação, o novo não é indicador de qualidade e a tecnologia não é condição única para os avanços do conhecimento. É claro que é preciso resolver muita coisa com brevidade, mas resolver com urgência o hoje, apenas cobre superficialmente os buracos do ontem, enquanto que a sociedade necessita é de uma revisão dos seus códigos de convivência, de uma reformulação ética e moral capaz de pavimentar a sociedade do amanhã.

Temos que reinventar o nosso espírito solidário de grupo. Vivemos em um planeta digital conectados em rede, mas nunca nos comunicamos tão pouco e estivemos tão sós e isolados. Uma das qualidades que fizeram da espécie humana uma das mais bem sucedidas entre as demais foi a capacidade de agir e reagir colaborativamente com seus pares. Portanto, menos risco e tensão e mais colaboração. Menos urgência e decisões superficiais. Mais seriedade e planejamento estratégico de médio e longo prazo para a vida.

Paulo Ricardo Bregatto
Arquiteto e Urbanista