quarta-feira, 2 de julho de 2014

Khalil Gibran

Foi presente da minha amiga Clarissa Reetz o pequeno livro O Profeta de Khalil Gibran. Achei este livrinho, que eu supunha perdido em minha biblioteca, hoje quando abri a última caixa de livros oriunda da mudança que fiz para o novo escritório. O mais coincidente e interessante de tudo é que justamente hoje (01 de julho) ela está de aniversário. A Clarissa é uma destas amigas que a vida nos oportuniza ter e que, mesmo sem o convívio diário, conseguimos manter firmes os laços de carinho, admiração e amizade. Ela foi minha aluna, na década passada, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Ulbra e este presente data daquela época. A dedicatória é linda, assim como é lindo o texto por ela sugerido “Sobre as Casas” que vou transcrever noutra postagem. Como introdução, neste texto, vai uma breve biografia do autor.

Gibran Khalil Gibran, Khalil Gibran, ou simplesmente Gibran, nasceu a 6 de dezembro de 1883, em Bicharre, aldeia da região montanhosa do norte libanês, a pequena distância dos milenares cedros. Sua família sofre pelas precárias condições de vida. O pai é um simples coletor de impostos rurais. A mãe, viúva de um casamento anterior, igualmente humilde.

Desde criança demonstra uma paixão irrefreável pelas tempestades. Tinha oito anos quando um violento temporal se abate sobre sua cidade. O pequeno Khalil, para desespero dos pais, recusasse a procurar abrigo. Prefere correr de encontro aos ventos, à chuva, aos relâmpagos. Mais tarde ele vai dizer que as tempestades libertam seu coração das preocupações e sofrimentos.

Ao completar doze anos de idade, sua mãe emigra para os Estados Unidos. O pai permanece no Líbano. Tudo indica que, devido à difícil situação material, a convivência entre os pais de Gibran ficara impossível. Kamilah, a mãe, decide viajar para os Estados Unidos, chegando a Boston com Gibran, seus irmãos Sultana, Mariana e Pedro, único filho de seu casamento anterior. Vão morar num pequeno gueto de sírio-libaneses, perto do Bairro Chinês de Boston, nos arredores da rua Hudson. Aqui tem início a odisseia americana de Khalil Gibran.

Toda a família começa a trabalhar no que pode, para sobreviver. Três anos depois, em 1898, Gibran é mandado de volta ao Líbano, sozinho. Em Beirute, estuda num colégio de padres maronitas. Dedica-se ao árabe, ao francês e à literatura, tanto oriental como ocidental. Demonstra raro interesse pelo estudo das religiões, procurando confrontar os ensinamentos cristãos com as informações recolhidas dos livros islâmicos. Devora praticamente a Bíblia e o Alcorão.

Em 1903, de volta a Boston, Gibran está resolvido a tentar viver explorando sua aptidão para a literatura e para a pintura. Colabora com jornais da comunidade sírio-libanesa nos Estados Unidos. Dedica-se a aprimorar o seu inglês. Toda a família continua a trabalhar intensamente. A mãe e as duas irmãs são costureiras e o irmão é empregado em uma loja. Khalil não volta a estudar, decidido a viver de sua arte.

O século começa com uma série de tragédias fatais para sua família. Entre 1902 e 1903 Gibran perde a irmã Sultana, a mãe e o meio-irmão Pedro, atingidos por enfermidades graves. Vive com a irmã Mariana, que sustenta a ambos com seu trabalho de costureira. Daí em diante, atira-se de corpo inteiro ao labor artístico.

Em 1904, realiza sua primeira exposição de pinturas e desenhos num atelier em Boston. Ali conhece a professora Mary Haskell que teria um papel decisivo em sua vida. Gibran tem vinte e um anos. Mary torna-se sua amiga fiel e companheira constante. Ajuda Gibran a progredir em seus conhecimentos de inglês e lhe dá um apoio sem o qual não conseguiria realizar a maioria de seus projetos.

Em 1908, viaja para Paris, onde Mary Haskell lhe oferece custear seus estudos artísticos. Permanece quase três anos em Paris, estudando na Escola de Belas Artes e na Academia Julien. Conhece Auguste Rodin. Uma de suas telas é escolhida para a Exposição das Belas-Artes de 1910. A temporada parisiense é intensa e fértil. Estuda, visita museus, escreve, pinta.

De volta a Boston, mora algum tempo com a irmã Mariana. No outono de 1911, Gibran muda-se para Nova Iorque, onde aluga um atelier no número 51 da rua Oeste 10, em um edifício em pleno Greenwich Village. Gibran reúne em volta de si um pugilo de escritores libaneses e sírios formando uma academia literária, que muito contribuiu para o renascimento das letras árabes. Apesar de toda essa efervescência, Gibran aprecia mesmo é trabalhar e isolar-se ao máximo. Suas aparições em público começam a tornar-se cada vez mais espaçadas, sentindo-se livre apenas quando está só. Come pouco e trabalha muito. Sempre que pode evita compromissos sociais. Todo esse potencial exuberante concentra-se em sua obra literária, numa carreira iniciada em 1905, escrevendo quase que exclusivamente em árabe.

Nesse período, até 1920, publica sete livros nessa língua: A Música, As Ninfas do Vale, Espíritos Rebeldes, Asas Partidas, Uma Lágrima e um Sorriso, As Procissões e Temporais. Quase todos estes livros causam um grande impacto no mundo árabe mexendo com temas polêmicos e trazendo transformações no tratamento do idioma, apontando-lhe outras possibilidades e tirando-lhe o véu de milênios. Gibran passa a ser reconhecido como escritor.

Rebelde em literatura, conservador em matéria de artes plásticas, mas prezando com devoção a liberdade de criação e proclamando sua fé na liberdade do artista. Torna-se ao mesmo tempo um retratista de prestígio. Pratica com talento a arte de reproduzir rostos e é requisitado com frequência para retratar personalidades notáveis da época. Mas é na criação de telas que ele espera atingir o que concebe como uma pintura mística, com seus quadros refletindo sempre uma inspiração clássica. Dizia: “quero que cada quadro seja o início de um outro quadro invisível”.

Gibran deixa, pouco a pouco, de escrever em árabe, dedicando-se ao inglês, publicando, em 1919 seu primeiro livro nessa língua: O Louco. Outros lhe seguem: O Precursor; O Profeta; Areia e Espuma; Jesus, o Filho do Homem; Os Filhos da Terra. Depois de sua morte ainda serão publicados mais dois livros: O Errante e O Jardim do Profeta.

Khalil Gibran morreu no dia 10 de abril de 1931, no Hospital São Vicente, em Nova Iorque, agonizando entre gemidos confusos, dentro de uma crise pulmonar que o deixara totalmente inconsciente. Tinha quarenta e sete anos de idade. Seu corpo, levado para Boston, fica sepultado provisoriamente no cemitério de Forest Hills. Em 21 de agosto de 1931 seus restos mortais são levados para Beirute, rumando depois, numa impressionante procissão, até Bicharre. No alto da montanha, Gibran é sepultado no antigo convento escavado na rocha de Mar Sarkis, onde ele imaginou viver seus últimos dias meditando.

Sobre o túmulo onde descansa, uma simples inscrição: “Aqui, entre nós, dorme Gibran”. Gibran Khalil Gibran pregava a fé num ser humano elevado à sua mais infinita potência: “Não siga ninguém nem acredite em coisa nenhuma a não ser em sua própria imortalidade”.

O Profeta, obra máxima de Gibran Khalil, vem alcançando sucesso permanente como poucos outros livros, desde seu lançamento em 1923. É um livro que atrai não só pelo pensamento e pelo estilo, mas também pela filosofia da vida nele contida. Khalil prega a ternura evangélica em meio ao progresso massacrante e à impiedosa competitividade dos tempos modernos. Sem impor ideologias, tenta despertar a bondade e a beleza escondidas sob a angústia e o desespero que perpassam nossa existência. Em suma, nos convida a vivermos as boas coisas da vida, a sermos dignos delas e a aproveitarmos o que há de mais elevado em cada um de nós.

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