quarta-feira, 25 de junho de 2014

Girassóis em Roma

Conheço Roma somente no inverno. Tenho na lembrança o pôr-do-sol mágico na escadaria de Trinità dei Monti na Piazza de Espanha, vendo o sol descer caprichosamente no eixo da Via dei Condotti ouvindo aquela sinfonia de sons gerados pela diversidade de idiomas ao meu redor. O azul do céu de Roma no inverno é de uma beleza fora do comum. E fica mais lindo quando contrastado pelos tons terracota das paredes envelhecidas das suas edificações e pelo verde novinho em folha dos ciprestes que emolduram a cidade.

Como sabemos, cada civilização se ergueu sobre as ruínas da civilização anterior e com Roma não poderia ser diferente. Roma, ao longo de sua gloriosa história, sofreu a ação de várias pequenas catástrofes. Uma sucessão de terremotos, invasões bárbaras, incêndios, guerras imperiais fizeram desta cidade o símbolo mais perfeito de renascimento. A cada tragédia uma nova cidade se erguia das cinzas da anterior. Poucos prédios ainda permaneceram em pé. Os mais antigos, se não me engano são aqueles dois pequenos templos do Fórum Boárium, atravessando a Ponte Palatino, o templo de Vesta (aquele de planta circular) e o de Apolo (aquele de planta retangular) que são do ano 200 a.C.



A Roma Imperial está 2,5m abaixo dos nossos pés e é possível, já que a cidade está em constante escavação, em alguns pontos da cidade andar lado a lado com a história. O Fórum de César e o Fórum de Trajano são bons exemplos disto. Podemos nos debruçar em peitoris na calçada, ladeados por estátuas dos grandes imperadores, e olhar os pisos ainda coloridos das construções imperiais.

No próprio Fórum Central Romano, sobre o monte Palatino (próximo ao Arco de Constantino e ao Coliseu), podemos ver uma série de pequenos artefatos etiquetados, ainda em parte enterrados, aguardando por sua catalogação.

Grande parte do que vemos hoje, em especial neste Fórum Central, se deve aos escavadores do exército de Napoleão que quando chegaram a Roma encontraram não mais do que 50 mil pessoas (para uma cidade que esteve perto dos 2 milhões de habitantes) habitando uma cidade fétida e insalubre. Para se ter uma idéia, o Arco de Sétimo Severo que se encontra lá no miolo do Fórum estava enterrado até o início da circunferência do arco e sob ele estava instalada uma pequena barbearia.

A propósito disto, o próprio Coliseu, que teve sua inauguração lá pelos idos do ano 80 d.C. já era uma ruína no ano 300 d.C., tendo sido restaurado várias vezes desde aquela época. Não fossem somente as tragédias naturais a sucatear o patrimônio arquitetônico, os próprios novos imperadores entronados tratavam de demolir ou descaracterizar as edificações feitas pelos seus antecessores. Podemos ver ainda uma série de pequenos buracos na fachada do coliseu fruto da retirada dos grandes painéis de mármore travertino que ajudaram a revestir outros tantos prédios de Roma entre eles a própria basílica de São Pedro. Falando nele, quando fui a Roma pela primeira vez, estando diante da estátua negra de São Pedro, no interior da basílica, disse a ele na minha oração que se um dia eu tivesse um filho ele se chamaria Pedro. Hoje meu Pedro está com 10 anos.

O que eu mais gosto de fazer nas minhas viagens é andar pelas ruas das cidades. Sentir a energia das pessoas no dia-a-dia de suas atividades cotidianas. Tocar as edificações, perceber as relações entre os espaços abertos e construídos e perceber o comportamento das pessoas que vivem nestes lugares. Para os arquitetos esta experiência é fundamental, pois esta vivência não está descrita em nenhum livro. Gosto de andar sem rumo pelas vielas escuras e estreitas imaginando tudo o que já aconteceu neste lugares.

Sempre leio muito antes de viajar. Leio de tudo. Dos livros de história aos romances que usam como pano de fundo as cidades que vou visitar. Gosto de estar num lugar e poder sentir e vivenciar aqueles fatos descritos nos livros. Sempre saio bem cedinho do hotel. Lá pelas 8h da manhã já estou na rua e volto somente quando a noite já se instalou. Viajar é uma experiência fantástica para qualquer pessoa, mas sempre digo que para os arquitetos tem um gostinho especial, pois passamos a vida inteira estudando a história para poder compreender o presente e propor o futuro.

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